O consumo de leite ou laticínios pode causar sintomas intestinais como dor abdominal, refluxo gástrico, vómitos, diarreia e até sintomas cutâneos (como comichão ou rosáceas na pele) ou respiratórios1. Então, mas o que significam estes sintomas? Sou intolerante à lactose?
Apesar de estes sintomas serem muito associados à intolerância à lactose, é importante ter em conta outros fatores como o tipo de alimento ingerido e a idade do indivíduo. Na verdade, não existe o termo “intolerância ao leite”. Este alimento pode, sim, estar na origem de duas condições: a intolerância à lactose ou a alergia às proteínas do leite. Vejamos as diferenças.
Intolerância à Lactose
70% da população mundial adulta tem algum tipo de intolerância à lactose2. Causada pela perda da capacidade intestinal para digerir a lactose, a intolerância à lactose pode ser uma condição permanente e irrecuperável (défice primário de lactase) ou pode estar a ser causada por outros distúrbios e, ser, por isso, temporária e reversível (défice secundário de lactase). Além disso, como abordamos neste artigo, existe um terceiro tipo de intolerância, mais raro: a deficiência congénita de lactase.2
Nos casos em que se verifica intolerância à lactose, a má digestão deste açúcar natural presente em todos os leites de mamíferos pode causar dor ou inchaço abdominal, ruídos intestinais, flatulência, náuseas, vómitos, diarreia e prisão de ventre.2 Estes sintomas surgem, geralmente, 30 minutos a 2 horas após a ingestão.1
A solução ideal para a intolerância é evitar consumir produtos com lactose. Em alternativa, é possível tomar suplementos alimentares de lactase, para ajudar o organismo a digerir os produtos lácteos.2
Alergia ao leite de vaca
O leite de vaca faz parte do grupo dos oito alimentos mais alergénicos, a par com ovo, soja, trigo, amendoim, frutos secos, peixe e marisco..3
Porém, ser alérgico a leite de vaca não significa, de todo, ser intolerante à lactose.1 À medida que envelhecemos, vamos perdendo a capacidade de digerir a lactose, por isso, a deficiência em lactase (mais conhecida como intolerância à lactose) é mais comum na população adulta4. Por outro lado, a alergia ao leite de vaca é uma reação imunológica e é mais frequente nas crianças.2
Assim, ao contrário dos intolerantes à lactose, as pessoas com alergia ao leite de vaca conseguem digerir adequadamente o leite, mas as proteínas ali presentes causam-lhes reações alérgicas.1 Dependendo do grau de sensibilidade e da quantidade de leite de vaca ingerido, os sintomas podem surgir menos de uma hora após a ingestão, sendo mais comuns os sintomas cutâneos, como comichão e eritemas (vermelhidão), e, de seguida, os sintomas gastrointestinais (vómitos, dor abdominal e, mais raramente, diarreia).1,3,5 Contudo, em casos mais graves, a alergia a leite de vaca pode causar distúrbios respiratórios ou mesmo quadros de anafilaxia potencialmente fatais.3
Geralmente, a alergia ao leite de vaca não é uma condição definitiva, ou seja, a criança poderá, numa fase mais tardia da vida, voltar a consumir leite de vaca, seus derivados e produtos que o contenham na sua composição6.
Como em qualquer alergia alimentar, o único tratamento possível é a eliminação do leite de vaca e de todos os alimentos que o contenham – mesmo que em doses reduzidas – da alimentação7. Uma vez que a ingestão de quantidades muito reduzidas do alimento alergénio é suficiente para provocar sintomatologia alérgica, é também necessário garantir que outros alimentos que contenham leite de vaca não entram em contacto com os alimentos que se vão ingerir, por forma a evitar a contaminação cruzada.7
Alguns conselhos para evitar a contaminação cruzada são7:
- Não utilizar as mesmas superfícies (bancadas, por exemplo) ou os mesmos utensílios (talheres, tábuas, panelas, etc…) para manejar alimentos contendo leite e alimentos livres do mesmo;
- Não cozinhar os alimentos no mesmo óleo ou água onde foram cozinhados outros alimentos;
- Lavar as mãos entre a manipulação dos alimentos;
- Evitar a partilha de louça, talheres ou guardanapos com outras pessoas, durante as refeições.
Referências Bibliográficas:
1 Ruiz Jr. AR. Intolerância à lactose – Distúrbios digestivos [Internet]. Manual MSD Versão Saúde para a Família. 2019 [citado 29 de Janeiro de 2021]. Disponível em: https://www.msdmanuals.com/pt/casa/dist%C3%BArbios-digestivos/m%C3%A1-absor%C3%A7%C3%A3o/intoler%C3%A2ncia-%C3%A0-lactose
2 Primeras preguntas [Internet]. No Lactosa: Asociación de intolerantes a la lactosa España. [citado 29 de Janeiro de 2021]. Disponível em: https://lactosa.org/la-intolerancia/primeras-preguntas/
3 Falcão I, Mansilha HF. Alergia às Proteínas do Leite de Vaca e Intolerância à Lactose. Portuguese Journal of Pediatrics (former Acta Pediátrica Portuguesa) [Internet]. 28 de Março de 2017 [citado 29 de Janeiro de 2021];48(1):53–60. Disponível em: https://pjp.spp.pt//article/view/9507
4 Mattar R, de Campos Mazo DF, Carrilho FJ. Lactose intolerance: diagnosis, genetic, and clinical factors. Clin Exp Gastroenterol [Internet]. 5 de Julho de 2012 [citado 29 de Janeiro de 2021];5:113–21. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3401057/
5 Enfermedades relacionadas [Internet]. No Lactosa: Asociación de intolerantes a la lactosa España. [citado 1 de Fevereiro de 2021]. Disponível em: https://lactosa.org/enfermedades/
6 Craveiro C, editor. Conhecer o Leite [Internet]. Associação Portuguesa dos Nutricionistas; 2016 [citado 1 de Fevereiro de 2021]. (Coleção E-books APN). Disponível em: https://www.apn.org.pt/documentos/ebooks/Ebook_Conhecer_o_Leite_Final.pdf
7 Nunes M, Barros R, Moreira P, Moreira A, Almeida MM. Alergia Alimentar. Em: Cunha P, Lima RM, Graça P, editores. Alergia Alimentar [Internet]. Ministério da Educação e Ciência – Direção-Geral da Educação & Ministério da Saúde – Direção-Geral da Saúde; 2012 [citado 1 de Fevereiro de 2021]. Disponível em: https://www.dgs.pt/documentos-e-publicacoes/alergias-alimentares-jpg.aspx